Uma iniciativa que reúne pesquisadores, transportadores e a indústria de laticínios no Rio Grande do Sul visa a combater fraudes no leite e resgatar a confiança do consumidor, abalada após sucessivas prisões de fraudadores nas operações Leite Compen$ado, do Ministério Público Estadual.
A partir de janeiro, entrará em teste o projeto Metodologia de Coleta Automática de Leite, desenvolvido pela Embrapa Clima Temperado, em Pelotas, em parceria com o sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados do RS (Sindilat) e a Cooperativa Sul-Riograndense de Laticínios Ltda (Cosulati).
As ações do MP revelaram que parte da adulteração no leite ocorre entre a saída do alimento das propriedades rurais e a chegada às indústrias. Pelo projeto, serão acoplados em caminhões de transporte medidores eletrônicos de vazão, reduzindo o contato manual com o leite (veja detalhes no quadro).
– O sistema auxiliará a garantir a segurança do produto – garante a coordenadora do projeto, Maira Zanela, pesquisadora da Embrapa.
Ao apresentar detalhes da proposta, Clenio Pillon, chefe-geral da Embrapa em Pelotas, afirmou se tratar de uma ação pioneira no Brasil, quarto maior produtor mundial de leite.
– A metodologia garante transparência no processo de produção. A sociedade cobra aplicar a rastreabilidade na produção de alimentos. É um caminho sem volta. Quem tiver mais visibilidade, terá vantagem em competitividade. Nosso leite tem qualidade e há espaço para qualificá-lo ainda mais.
O secretário estadual da Agricultura, Ernani Polo, lembra da nova legislação do leite, em pauta na Assembleia Legislativa – e que poderá ser votada nesta semana.
– Tivemos problemas por causa de pessoas que prejudicaram milhares de famílias que tiram do leite o seu sustento. Temos lacuna na legislação, e a lei permitirá determina melhor controle em todas as etapas da produção.
O presidente do Sindilat, Alexandre Guerra, lembra o quanto custa construir uma marca. E afirma que o momento vivido pelo setor é o ideal para fazer uma revolução:
– O projeto é bom para o produtor, ótimo para o transportador e indústria e melhor ainda para o consumidor.
Saiba mais:
As diferenças de manuseio no transporte de leite:
A coleta
Produtor ordenha vacas e acondiciona o leite em compartimento resfriado. Pode ficar ali por, no máximo, 48 horas.
Ao buscar o leite, o transportador mistura em um frasco uma porção de leite com álcool para testar se não talhou (em caso positivo, não poderá levar para a indústria). Nem sempre o transportador é um profissional habilitado para o transbordo do leite. É comum a operação ser conduzida pelo próprio caminhoneiro.
Modo manual
Com uma régua, mede o volume de leite.
Conecta mangueira de sucção para transferir o leite até o tanque refrigerado do caminhão. Em um recipiente, coleta uma amostra a ser entregue à indústria. Isso é importante porque o caminhão recolhe leite em dezenas de produtores, em caso de anormalidade no conteúdo do tanque do caminhão, é possível identificar a origem do problema.
Modo automático
O transportador não manipula o leite.
O caminhão é equipado com um medidor automático de vazão, composto por um computador de bordo que mede o volume de leite e está conectado a um GPS. Ali são inseridos dados do produtor. Se o caminhão não estiver na propriedade correta, o equipamento não permite a retirada do leite.
O transportador lança os dados no computador e conecta a mangueira de captação. A mangueira passa por um compartimento refrigerado, no qual goteja amostra do leite em frascos de 40 ml, etiquetado com código de barras que identifica o produtor.
A amostra é entregue à indústria para, se houver anormalidade no conteúdo, saber a origem do problema.
Ao final da coleta, informações registradas pelo computador como volume de leite, horário e temperatura da coleta, dados do produtor, do transportador e da indústria são transferidas, via internet, para a indústria. Um extrato é entregue ao produtor.
O projeto
A coleta automatizada é um experimento desenvolvido pela unidade da Embrapa Clima Temperado, em Pelotas, em parceria com o Sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados do RS (Sindilat) e a Cooperativa Sul-Riograndense de Laticínios Ltda (Cosulati).
Medidores automáticos serão acoplados a cinco caminhões que transportam leite para a Cooperativa Sul-Riograndense de Laticínios Ltda (Cosulati), que fica quase ao à sede da Embrapa.
Objetivo
Comparar o processo de coleta manual com a automática, visando a garantir a qualidade do leite e reduzir risco de fraude.
Testes
O sistema estará sob avaliação, a partir de janeiro, durante dois anos. Serão feitas três tipo de coleta: manual por um transportador, manual por um técnico da Embrapa e automática com o equipamento. Serão avaliados o tipo de tanque de armazenagem, variações de temperatura e até as condições das estradas, entre outros quesitos. O Ministério Público será convidado a acompanhar os testes. Ao final, dependendo dos resultados, a Embrapa fará recomendações técnicas.
Custo
Os testes custarão R$ 500 mil, sendo R$ 360 mil bancados pelo Sindilat e o restante, pela Embrapa.
Medidores automáticos de vazão são fabricado no Brasil e no Exterior
. O custo varia entre R$ 60 mil e R$ 150 mil.
À medida que o projeto se consolidar, a ideia é que o sistema seja acoplado a todos os caminhões de coleta de leite.
Os custos deverão ser compartilhados entre produtores, transportadores e laticínios, contando, também, com desoneração de impostos.
O leite no Estado, no Brasil e no mundo
Nos últimos 10 anos, a produção de leite cresceu 98% no Rio Grande do Sul – o segundo maior produtor do alimento no país, atrás apenas de Minas Gerais -, o dobro do crescimento médio no país.
São cerca de 100 mil famílias dedicadas à atividade com impacto na economia em 95% dos municípios gaúchos.
No Rio Grande do Sul, em média, são ordenhados, de uma vaca, 3 mil litros por ano – a média nacional é 1,5 mil litros.
Nos Estados Unidos, maior produtor mundial de leite, são ordenhados 9,6 mil litros de uma vaca anualmente. O segundo país no ranking é a Índia, seguido da China e do Brasil, quarto colocado.
Zero Hora