Saber diferenciar vacinação de imunização é importante para que o produtor rural garanta a saúde dos animais no campo. “Embora muitas pessoas tratem como termos semelhantes, eles não são sinônimos”, alerta a pesquisadora Lenita Ramires dos Santos, da Embrapa Gado de Corte (MS).
Segundo ela, a vacinação se refere ao ato de inocular a vacina, enquanto que imunização diz respeito à indução de proteção adquirida contra determinada doença, um resultado adequado e eficiente do processo de vacinação. “Nem sempre a vacinação leva à imunização. É preciso considerar que vários são os fatores que podem comprometer o resultado final de um processo de vacinação”, diz a especialista.
De modo geral, Lenita destaca que estes fatores podem estar relacionados ao produto, às características do indíviduo/animal e ao próprio ato de inoculação, entre outros. “O sucesso obtido pela vacinação pode ser favorecido pelo uso de boas práticas de vacinação.”
“Mesmo que as vacinas não sejam capazes de induzir proteção em todos os indivíduos, ao considerarmos a população efetivamente imunizada, a vacinação gera o que conhecemos como “imunidade de rebanho”. Isto significa que, se a maioria dos animais está protegida pela vacinação, a circulação do agente causador da doença naquela população diminui e o risco de infecção em animais sadios também. Este fenômeno é tão importante que algumas doenças, como a varíola humana e a peste bovina, já foram erradicadas em todo mundo”, comenta.
FATORES NÃO GENÉTICOS
Dentre os fatores não genéticos que podem influenciar na imunidade do animal, a pesquisadora da Embrapa Gado de Corte cita a idade, o estado nutricional, o estresse e a prenhez, entre outros. “Os anticorpos (principais componentes do sistema imunológico a atuar contra o estabelecimento de doenças em animais vacinados) são proteínas e, portanto, animais subnutridos ou submetidos a dietas com baixa quantidade de proteínas podem apresentar queda da imunidade.”
Em animais muito jovens ou idosos, destaca Lenita, o sistema imunológico tende a não funcionar tão adequadamente quanto em animais adultos. “O estresse, por sua vez, gera a liberação de alguns mediadores químicos que podem diminuir a imunidade. Além disto, em animais doentes, o sistema imunológico está mobilizado para combater aquela doença e, quando vacinados, não responderão à vacina de forma adequada. Já a prenhez afeta negativamente as defesas do animal, pois requer a supressão da imunidade materna, para evitar a rejeição do feto.”
MEDICAMENTOS
A pesquisadora também salienta que os produtores rurais também devem diferenciar as vacinas dos medicamentos, principalmente porque eles são importantes para a manutenção da saúde tanto dos seres humanos quanto dos animais.
“De forma resumida, podemos dizer que as vacinas têm a função de prevenir doenças pela estimulação do sistema de defesa do indivíduo/animal, enquanto que medicamentos são usados para tratar doenças, ou seja, via de regra, as vacinas tem ação preventiva enquanto os medicamentos tem ação terapêutica.”
Além disto, continua Lenita, “enquanto medicamentos têm efeito visível e, às vezes, imediato, as vacinas demoram em torno de 15 dias para começar a fazer efeito e este efeito não é perceptível”. “Podemos acrescentar ainda que os benefícios pela utilização de vacinas e medicamentos também podem diferir, podendo ocorrer de forma individual ou coletiva para o uso de vacinas e apenas individual, para o uso de medicamentos.”
EFICÁCIA
Pesquisadora da Embrapa Pecuária Sul (RS), Emanuelle Baldo Gaspar destaca que fatores relacionados à genética do animal ou à forma como a vacina foi produzida não podem ser controlados pelo produtor rural. “Entretanto, ele pode lançar mão de um conjunto de práticas, conhecidas como ‘boas práticas de vacinação’, que visam à maximização do efeito potencial de determinada vacina”, salienta.
Entre as boas práticas de vacinação, Emanuelle resume o que o produtor deve fazer:
* Adquirir apenas vacinas licenciadas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), dentro do prazo de validade;
* Adquirir vacinas de varejistas idôneos (ou confiáveis), que mantenham a vacina refrigerada até o momento da venda;
* Agitar os frascos antes de usar para que todos os animais recebam a mesma quantidade de princípio ativo;
* Não usar vacinas de frascos abertos (sobras) ou vencidas;
* Revisar as instalações de manejo antes da vacinação, para assegurar a segurança tanto das pessoas envolvidas no processo quanto dos animais a serem vacinados e permitir a contenção adequada durante o manejo;
* Estocar as vacinas de forma adequada (entre 2ºC e 8ºC, na geladeira), inclusive durante o transporte ou no dia do manejo (em caixa térmica contendo três partes de gelo para cada parte de vacina). O frasco da vacina em uso também deve ser mantido dentro da caixa térmica, mesmo no curto intervalo de tempo entre o preenchimento das pistolas (ou seringas). Também as pistolas devem ser mantidas sobre o gelo entre uma embretada e outra, se houver líquido dentro;
* Evitar estressar os animais antes, durante e após o manejo – não manejá-los com truculência e gritaria, não deixá-los longos períodos presos, sem acesso à água e comida; disponibilizar sombra aos animais;
* Evitar vacinar animais em mau estado nutricional, como, por exemplo, durante período prolongado de seca, ou animais debilitados por outras doenças;
* Utilizar agulhas de tamanho adequado, com bom estado de conservação, limpas e desinfetadas (o que pode ser feito por fervura durante 15 minutos). Seringas ou pistolas também devem estar limpas e desinfetadas. A cada 10 animais a agulha deverá ser trocada, descartando agulhas desgastadas e/ou tortas, lavando e desinfetando agulhas em condições de ser reutilizadas. Ao final do procedimento o material deve ser guardado limpo e seco;
* Usar uma agulha exclusiva para a retirada da vacina do frasco, não a usando em nenhum animal, para evitar contaminações;
* Aplicar a dose recomendada pelo fabricante, na via adequada (intramuscular ou subcutânea);
* Preferencialmente, vacinar na tábua do pescoço ou atrás da escápula, no caso das vacinas subcutâneas, evitando a aplicação na garupa. Como algumas vezes podem ser formados abcessos ou hematomas, após a vacinação, evite injeções em áreas de carnes nobres;
* Ficar atento para as vacinas que requerem mais de uma dose na primo-vacinação (primeira vez que os animais são vacinados) e observar corretamente intervalo entre uma vacinação e outra;
* Fazer revacinações anuais ou semestrais quando estas forem indicadas nas bulas dos produtos.
VACINAS OBRIGATÓRIAS NO BRASIL
Fora a vacinação contra a febre aftose e a brucelose, a legislação brasileira não obriga tal prática em outros animais. “Realmente, apenas as vacinas de brucelose e febre aftosa são obrigatórias no Brasil, mas lembrando de que em Santa Catarina não se pode vacinar contra febre aftosa, por se tratar de um Estado com status de área livre da doença sem vacinação”, comenta Emanuelle.
Segundo a pesquisadora da Embrapa Pecuária Sul, a vacina contra raiva é obrigatória somente quando há focos da doença e os Estados podem legislar complementarmente sobre a necessidade de vacinação compulsória e sistemática em áreas consideradas de risco.
“Apesar de poucas serem obrigatórias em bovinos, diversas vacinas estão disponíveis para a vacinação destes animais no Brasil”, salienta Emanuelle, citando o documento “Vacinação de Bovinos: Esclarecendo Algumas Dúvidas”, publicado pela Embrapa (link encurtado:ow.ly/B2p0302n3WX).
No documento, existe uma tabela listando as vacinas licenciadas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), que incluem vacinas contra a rinotraqueíte infecciosa bovina (IBR), diarreia viral bovina (BVD), clostridioses, mastite, salmonelose, doenças responsáveis por aborto, diarreia, botulismo, entre outras.
“Com relação ao uso destas vacinas no campo, o diagnóstico da necessidade de vacinação deve ser feito por um médico veterinário, que é o profissional responsável por identificar as doenças, que estão ocorrendo na propriedade para indicar as vacinas que devem ser usadas. Vacinas contra carbúnculo hemático e sintomático, leptospirose e botulismo são de uso relativamente comum no campo”, cita a pesquisadora da Embrapa Pecuária Sul.
Por equipe SNA/RJ