Uma boa notícia para os pecuaristas que estão investindo em sistemas silvipastoris, em que o plantio de árvores é associado à criação de gado e ao cultivo de forrageiras para pastagens. Pesquisas realizadas na Embrapa Pecuária Sudeste, em São Carlos (SP), indicam que a infestação por mosca-dos-chifres nesse modelo de integração é 38% menor do que no convencional.
De acordo com a pesquisadora da Embrapa Márcia de Sena Oliveira, alterações de microclima e a microfauna associada ao bolo fecal dos bovinos criados nesses sistemas afetam a dinâmica da população das moscas.
Para obter informações mais concretas, foi realizado um estudo do comportamento das infecções por vermes e das infestações pelo carrapato (Rhipicephalus microplus), mosca-dos-chifres (Haematobia irritans) e berne (larvas de Dermatobia hominis) em bovinos de corte. A comparação foi realizada entre animais criados em pastagem integrada com árvores nativas e criados no modelo pecuário convencional, apenas pastagem e gado. A pesquisa ocorreu entre 2013 e fim de 2015 na Fazenda Canchim, sede da Embrapa Pecuária Sudeste.
A análise dos dados de contagens de carrapatos não mostrou diferenças significativas entre os dois sistemas, embora os animais criados no modelo convencional tenham apresentado médias um pouco superiores. Em relação aos vermes e aos bernes, os testes nos dois sistemas mostraram médias de parasitismo semelhantes. Já para a mosca-dos-chifres, foram encontradas diferenças significativas nos animais dos dois modelos. As menores médias foram observadas na integração da pecuária com as árvores nativas.
Para a pesquisadora, tal fato pode ocorrer devido à maior quantidade e diversidade da microfauna associada aos bolos fecais dos animais criados no sistema com árvores e que atuam como predadores das fases de vida livre desse parasita. As fêmeas da mosca-dos-chifres colocam seus ovos nas fezes frescas dos bovinos, local em que se desenvolvem. “Esses insetos associados ao bolo fecal podem ter influenciado na menor infestação de moscas no silvipastoril, porque reduziram o desenvolvimento das fases de vida livre do parasita”, explica. Ou seja, a maior diversidade e quantidade de insetos no sistema silvipastoril pode indicar que nesse modelo as interações ecológicas contribuem para o equilíbrio populacional de ectoparasitas, como a mosca-dos-chifres.
Na propriedade de Maria Fernanda Guerreiro, na cidade de Brotas, interior de São Paulo, a mosca-dos-chifres não é problema. Segundo ela, a integração da pecuária com árvores mostrou-se eficiente nesse controle. Empiricamente, é o que a pecuarista vem constatando ao longo do tempo, confirmando os resultados obtidos pela pesquisa da Embrapa.
Em 2011, quando implantou o sistema de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) na fazenda, Maria Fernanda arrendou cerca de 20 hectares para criação de gado. “Eu arrendei uma parte para o meu vizinho, que tem uma produção extensiva, em sol pleno. Eu manejei os animais no sistema ILPF”, conta. O arrendatário, segundo ela, fazia o controle de endo e ectoparasitas constantemente em sua fazenda. Na época de fazer o controle, ele foi até a propriedade, preparado para aplicar o inseticida e as vacinas nos animais. No entanto, o vizinho não precisou usar a medicação. “A gente vê, na prática, que diminui. Não chega a não ter moscas, mas a quantidade é muito menor do que no convencional. Principalmente em uma área que eu tenho com a árvore citriodora (Corymbia citriodora). Não sei se é o cheiro, mas houve uma diminuição significativa, tanto de mosca, quanto de carrapato. É importante destacar que na fazenda do arrendatário, que usa o sistema convencional, com a mesma categoria animal e mesma procedência, ele precisou fazer o controle”, explica.
Diferentemente de Maria Fernanda, o produtor Henrique Barbosa Strang, da Fazenda Tradição, no Município de Lavínia (SP), sofre com infestação de mosca-dos-chifres, principalmente no verão. Strang possui gado de corte, da raça Nelore, em uma fazenda convencional. Para ele, os principais prejuízos com a mosca são a perda de peso, gastos com inseticidas e manejo desnecessário com o gado no curral. “As moscas promovem um incômodo diário, fazendo com que os animais gastem energia na tentativa de dispersá-las”, explica.
No verão, época de maior incidência, os animais são tratados com produtos de melhor eficácia. “Já nas épocas de menor incidência, apenas tratamos os animais se realmente a infestação atingir um nível de incômodo grande, daí os produtos são os mais baratos”, diz.
O produtor considera plantar eucaliptos de forma integrada, como nova fonte de renda e para agregar valor à propriedade. Para ele, a informação de que a infestação por mosca-dos-chifres é menor nesse tipo de modelo contribui para fortalecer ainda mais a ideia de implantar o sistema integrado em sua fazenda.
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Mosca-dos-chifres
Infestações pela mosca-dos-chifres, juntamente com carrapatos e infecções por vermes, estão entre as principais parasitoses bovinas. Além do prejuízo econômico para os pecuaristas, os parasitas afetam a saúde e o bem-estar animal.
Outro problema é o aumento do número de insetos resistentes aos produtos usados para o controle da mosca. O uso inadequado e frequente favorece a seleção de parasitas mais resistentes. “Os pecuaristas não gostam de ver as moscas em torno dos animais. Então, eles usam o inseticida de modo incorreto e sem controle, causando a resistência”, explica a pesquisadora. Essa é uma preocupação do pecuarista Henrique Strang. Para evitar os riscos de resistência, ele faz rotação de pastagem. “Procuramos não utilizar inseticidas muito agressivos, com efeitos prolongados e que possam interferir nos inimigos naturais da mosca”, enfatiza.
A mosca-dos-chifres parasita bovinos, bubalinos e equídeos, principalmente. Elas alimentam-se de sangue. Seu desenvolvimento depende de condições climáticas favoráveis.
Segundo a pesquisadora Márcia, é importante destacar que os resultados de produtividade foram iguais tanto para o convencional como para o silvipastoril. Tal fato indica que o manejo das doenças não precisa ser diferenciado para qualquer dos parasitas estudados, especialmente em relação à mosca-dos-chifres, que teve sua população reduzida na integração da pecuária com árvores.
O bem-estar dos animais também foi observado nesse modelo, porque as árvores contribuíram para a redução da temperatura com áreas sombreadas. “Os animais criados no silvipastoril apresentaram temperamento mais dócil e calmo, além disso ficaram mais tempo pastejando. Para o produtor é um aspecto positivo, já que os animais ganham mais peso e produzem mais leite”, conta.
Experimento
A pesquisa realizada pela Embrapa Pecuária Sudeste utilizou 32 bovinos da raça Canchim – 16 em cada um dos sistemas. O projeto foi financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
Os animais entraram no experimento desmamados, com idade próxima aos oito meses. Foram identificados por brincos, vacinados contra febre aftosa e clostridioses, além de tratados com carrapaticida e anti-helmíntico.
Todos os animais receberam suplementação mineral e água durante o período em que ficaram nos piquetes, na forma de pastejo rotacionado. Durante toda a estação seca, receberam mistura mineral proteinada.
As contagens de parasitas foram feitas com intervalos de 42 dias, correspondendo a um ciclo de pastagem, já que os animais deveriam ser levados ao curral para pesagens.
Foram realizados diferentes tipos de análises para chegar aos resultados. Os dados parasitológicos foram avaliados relacionando-os com os dados climáticos, a capacidade de suporte das pastagens, o ganho de peso, os indicadores de bem-estar e saúde dos bovinos, além de dados relativos à microfauna associada aos bolos fecais, nos dois tipos de sistema.
Durante o período do experimento, os pesquisadores envolvidos realizaram 18 coletas de fezes, sangue e contagens de parasitas.
Segundo Márcia, nessa pesquisa a Embrapa buscou dados mais consistentes, que pudessem facilitar a indicação dos sistemas silvipastoris para os produtores rurais. No entanto, algumas interferências obrigaram os pesquisadores a estender o prazo do projeto. “Os últimos anos foram de intensa seca no Estado de São Paulo, principalmente em 2014, o que tornou mais difícil a obtenção desses dados, tendo em vista a baixa capacidade de suporte das pastagens. Para melhorar as nossas amostragens, o experimento foi estendido por mais seis meses, após o término do projeto”, conta.
Os resultados indicaram que não são necessárias alterações no controle parasitário tradicionalmente usado nos sistemas convencionais, se o produtor optar por usar o silvipastoril nos moldes deste experimento.
Árvores e animais
O sistema silvipastoril integra árvores, pastagem e gado na mesma área. Esses modelos têm sido boas alternativas para os produtores rurais diversificarem a produção e melhorarem a renda. Outro fator a ser considerado é que a implantação desse sistema é incentivada pelo governo federal, por ser uma tecnologia importante para redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE).
Ao incluir árvores, o pecuarista proporciona bem-estar animal por meio de áreas sombreadas. No entanto, quando se integra o plantio de árvores com pecuária, o controle deve ser constante devido à competição por luz, água e nutrientes entre a pastagem e as espécies arbóreas.
Não existe um modelo padrão para adoção. O produtor rural deve conhecer as possibilidades e implantar a alternativa mais viável para a realidade da sua propriedade.
Gisele Rosso (MTb 3091/SP)
Embrapa Pecuária Sudeste
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