A FBN é um processo realizado por bactérias capazes de capturar o nitrogênio que está presente no ar na forma de um gás (N2) e transformá-lo em amônia (NH3), permitindo que a planta assimile o nitrogênio, elemento essencial ao desenvolvimento vegetal. A aquisição desse importante macronutriente pelas plantas pode ser por meio de adubação, pelo uso de matéria orgânica do solo e pela fixação biológica
O pau-rainha é uma leguminosa arbórea que se beneficia do processo de FBN através da simbiose com bactérias conhecidas como rizóbios, relação que está sendo estudada por pesquisadores da Embrapa desde 2010.
Os estudos revelaram uma grande diversidade de bactérias que realizam esse processo e foram isolados 178 rizóbios oriundos de diversas regiões do Estado de Roraima. Esses microrganismos foram identificados e foi encontrada, entre eles, uma nova espécie do gênero Bradyrhizobiumnomeada Bradyrhizobium neotropicale, que tornou-se a primeira bactéria desse gênero nativo do Brasil.
Conhecer a diversidade de bactérias associadas ao pau-rainha facilitará a produção de mudas e a utilização dessa leguminosa em manejos sustentáveis e programas de recuperação de áreas nativas desmatadas, sem a introdução de espécies exóticas na região, explica a pesquisadora da Embrapa Roraima Krisle da Silva.
A cientista é uma das coordenadoras da pesquisa e já está trabalhando na propagação de mudas de pau-rainha em viveiro, inoculadas com bactérias eficientes no processo de FBN. Essa etapa é uma exigência do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa) para a indicação de inoculantes comerciais para a planta.
A pesquisa também buscou avaliar a eficiência dessas bactérias, visando a encontrar os rizóbios que mais contribuem com o fornecimento de nitrogênio para o pau-rainha. Segundo Krisle, a maioria das bactérias nodulantes descritas foi isolada a partir de leguminosas de grande interesse agrícola, como a soja e o feijão-caupi, mas ainda há poucos estudos sobre leguminosas arbóreas e sua interação com bactérias fixadoras de nitrogênio.
Além da possibilidade de exploração sustentável e de utilização para recuperação ambiental, a pesquisa se concentrou no pau-rainha por ser uma espécie ameaçada pela exploração madeireira. “É uma pesquisa que ajudará na preservação dessa leguminosa arbórea e dos microrganismos presentes nela, além de ampliar o conhecimento sobre a biodiversidade brasileira, principalmente em relação aos microrganismos do solo”, ressalta Krisle.
Bactérias selecionadas
A pesquisa tem o objetivo de selecionar rizóbios eficientes na atividade de fixação biológica de nitrogênio para a produção de mudas. As etapas da pesquisa envolveram coletas em ilhas de mata do Estado de Roraima de raízes de pau-rainha para obtenção dos nódulos e posterior isolamento das bactérias em meio de cultura.
De um total de 355 nódulos selecionados, foram isolados 178 rizóbios. Desses, com base em informações obtidas após a caracterização fenotípica, genética e capacidade de nodulação (a capacidade de realmente fixar nitrogênio), 18 foram selecionados para os testes em mudas de pau-rainha. No primeiro teste, em casa de vegetação, quatro bactérias se destacaram na produção de mudas de pau-rainha, entre elas a espécieBradyrhizobium neotropicale.
Os testes com as quatros bactérias foram realizadas novamente, mas na produção de mudas em viveiro. A etapa de testes em viveiro é importante para a recomendação desses rizóbios como inoculantes, o que promoverá maior eficiência na produção de mudas. Além dos testes em viveiro, as mudas inoculadas com essas estirpes serão avaliadas em condições de campo, o que ocorrerá em maio de 2016.
Segundo a técnica de laboratório da Embrapa Roraima Eliane Cunha, essas quatro bactérias já foram incluídas na Coleção de Microrganismos Multifuncionais da Embrapa em Roraima. Eliane lembra que este tipo de pesquisa é bastante complexa e leva muito tempo. “Já estamos na fase de testes em viveiros, uma alternativa para propagar o pau-rainha e integrá-lo em programas de reflorestamento. Também já foram publicados dois artigos científicos que descreveram as bactérias eficientes na fixação biológica de nitrogênio e também a descrição da nova espécie”, explica.
O pau-rainha
O plantio do pau-rainha pode gerar uma série de produtos e serviços viáveis para exploração econômica. A leguminosa pode alcançar até 30 metros de altura e é adaptada a pouca chuva e solos pobres. É encontrada no Panamá, Equador, Colômbia, Venezuela, Guiana, Suriname e norte do Brasil, onde está presente em ilhas de mata e em florestas de transição no Estado de Roraima.
A planta exerce diversas funções ecológicas que contribuem para a sustentabilidade do ambiente. Isso porque o pau-rainha, ao realizar a simbiose com bactérias fixadoras de nitrogênio, transfere parte desse nitrogênio para o solo por meio da deposição de suas folhas, melhorando a fertilidade nessas áreas, o que beneficia outras plantas.
Ela também tem função protetora contra os efeitos erosivos, sendo frequentemente estudada em programas de reflorestamento ou recuperação de áreas degradadas em virtude da agilidade em promover a sucessão vegetal.
Além da importância ecológica, o pau-rainha também tem um alto potencial madeireiro e é geralmente usado na construção de habitações e também como lenha. Além disso, é empregado na fabricação de móveis, vigas, caibros, escadas, pisos, e para fins medicinais e extração de corante.
Entenda a FBN
O nitrogênio é um dos elementos mais importantes para o crescimento vegetal. É fornecido às plantas por meio de grupos bacterianos em um processo conhecido como fixação biológica de nitrogênio (FBN).
Dentre essas bactérias, as mais utilizadas são os rizóbios, que se associam de forma específica a plantas leguminosas. Esses microrganismos colonizam raízes com a formação de estruturas denominadas de nódulos, que conseguem captar o nitrogênio do ar e disponibilizá-lo às plantas. Esta interação é particularmente importante nos estágios iniciais de desenvolvimento vegetal.
Entre as vantagens trazidas pelo uso da FBN está a redução de investimentos em adubação nitrogenada, o que representa uma economia anual de U$ 6,6 bilhões só no Brasil. Além disso, é uma tecnologia agrícola sustentável que ajuda a diminuir a contaminação de recursos hídricos e a emissão de gases do efeito estufa.