Encontro promovido pela campanha Agro Cooperação abordou o quanto a boa comunicação e a parceria entre as duas frentes podem aumentar a produtividade de colmeias e lavouras no MS
Apiários instalados junto a lavouras de soja e beneficiando tanto a produção de mel quanto a colheita de grãos. Por trás disso, uma receita de convivência baseada na troca de informações entre apicultores e agricultores, com doses generosas de técnicas adequadas de manejo das colmeias e de boas práticas nas aplicações de defensivos nas plantações. Ingredientes que foram a tônica da segunda live da campanha Agro Cooperação – uma consciência, inúmeros benefícios, transmitida na tarde desta quarta-feira (27) pelo canal Fonteagro no YouTube (reveja clicando AQUI).
A inciativa da Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar do Mato Grosso do Sul (Semagro) teve desta vez a participação do presidente da Cooperativa dos Apicultores do Pampa Gaúcho (CooaPampa), Aldo Machado, e o agrônomo e apicultor sul-mato-grossense Luiz Renato Peixoto. A mediação ficou a cargo do especialista em Uso Correto e Seguro do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg), Daniel Espanholeto.
Durante pouco mais de uma hora, os convidados falaram sobre suas experiências na produção de mel em áreas de produção de grãos, mostrando que não só a convivência é possível, com pode garantir aumento de produtividade de ambos os lados. Tudo a partir do diálogo e do conhecimento de cada um sobre o manejo na atividade do outro e da articulação (complementariedade) entre ambos.
Os dois também responderam as dúvidas dos internautas, especialmente sobre manejo das colmeias, benefícios para os produtores e onde buscar qualificação. Eles enfatizaram a importância dos apicultores se cadastrarem junto à Agência Estadual de Defesa Sanitária, Animal e Vegetal do Estado (Iagro), que coordena o Agro Cooperação. Iniciativa, aliás, que conta com a parceria do Sindiveg, do Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola (Sindag), Associação Nacional dos Distribuidores de Insumos Agrícolas e Veterinários (Andav) e o apoio da Associação Estadual de Engenheiros Agrônomos do MS (AEAMS).
BONS RESULTADOS NO SUL
Aldo Machado iniciou o papo com os apicultores, dividindo com a audiência a visão de mais de 30 anos de apicultura, os últimos cinco dos quais com a percepção de uma mudança radical (e para melhor) nas relações com produtores rurais no oeste gaúcho. Ele lembrou que, com a expansão das lavouras de soja na região, muitos apicultores começaram a retirar suas colmeias das áreas de produção, até que ele fez um trato com um agricultor amigo seu, proprietário de uma área onde ele normalmente colocava suas colmeias.
“Ele disse que, se eu quisesse deixar as caixas ali próximo, ele não se responsabilizaria por algum eventual dano. Mas se comprometeu a fazer todas as aplicações nas lavouras de forma correta”, lembrou o apicultor. As abelhas então ficaram próximas à lavoura em plena época de florada da soja. E o que aconteceu? “Quando voltei para alimentar as abelhas, em janeiro e fevereiro, elas estavam boas. Mas como elas estavam boas se não havia alimentos na região (pela falta de pasto apícola nessa época?) Aí vimos que as abelhas estavam visitando a soja. Os enxames cresceram e não houve problemas com as aplicações feitas na lavoura.” Também não foi registrado contaminação do mel. “Isso porque as abelhas detectam toxicidade e não coletam pólen onde há problemas. Além disso, o próprio mel da floração de soja tem características especiais: uma coloração muito boa e um aroma floral. É um mel suave e, além disso, ele não cristalizar tão fácil”.
Machado – que também representa a apicultura na Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul) e na Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), em Brasília, deixa claro que não foi por acaso que essa experiência deu certo. Tem a ver também com técnica no manejo das colmeias. “A CooaPampa tem hoje 700 poucos sócios, com cerca de 48 mil colmeias. Só ele tem cerca de 3 mil colmeias na região do município de São Gabriel. No ano passado, preparei as abelhas para levar para a soja – alimentei elas bem (para que continuassem fortes na entressafra) e levei elas boas para a soja. “Para minha surpresa, com 800 colmeias juntas à soja, tiramos 23 toneladas de mel – mais de 28 quilos por colmeia, o que é mais do que a média nacional.”
Provocado por Espanholeto (o mediador da live também integra a equipe técnica do movimento Colmeia Viva, do Sindiveg, que atua na região), o apicultor gaúcho lembrou que a parceria ente apicultores, produtores e empresas aeroagrícolas tem um apoio forte das rádios locais. Um canal por onde são repassadas o tempo todo dicas de manejo e boa convivência entre as partes. “Só a rádio de São Gabriel abrange 60 municípios. Chega em todo mundo no campo.”
VANTAGENS NO MS
Já Luiz Renato reforçou que, apesar de a soja não ser uma cultura dependente de polinizadores, a cultura claramente se beneficia da presença das abelhas. “A vagem da soja polinizada por abelhas tem mais grãos e cada grão tem mais peso”, destacou. Embora não tão desenvolvida quanto no Rio Grande do Sul (que é segundo maior produtor de mel, atrás do Paraná, e segundo também na produção e soja, atrás do Mato Grosso), a apicultura sul-mato-grossense (décima em produção, no ranking nacional) busca a excelência costurando uma boa relação com a lavoura de soja (da qual o Estado é o quinto maior produtor no País). Ao menos esse é um dos objetivos do Agro Cooperação e tem a ver com o perfil do segundo convidado da live desta quarta. Luis Renato Peixoto Cavalheiro é agrônomo, apicultor e produtor rural na região de Dourados, no oeste do Estado. Ele começou a lidar com abelhas ainda criança, nos apiários de seu pai. Quando concluiu a faculdade de Agronomia, foi trabalhar para uma empresa que beneficiava sementes de girassol, desenvolvendo um trabalho para produção de grãos para o período de entressafra.
“Em contato com produtores de girassol, um deles falou: ‘eu quero plantar girassol, mas para produzir mel’. Ele disse que o girassol deveria pagar o investimento, mas o lucro viria do mel”, lembrou o agrônomo. Foi com esse produtor que ele acabou aprendendo mais a fundo as técnicas de apicultura, que mais tarde conciliou com produção de grãos. Tanto que passou a desenvolver as duas atividades ano a ano e nunca teve perda de colmeias por uso de defensivos na lavoura. “Isso às vezes não ocorre na prática, quando cada um quer desenvolver sua atividade sem conhecer a do outro. Aí, quando vão interagir, ocorrem os problemas”, reforçou, batendo novamente na tecla da necessidade de comunicação. O agrônomo e apicultor também falou de seu trabalho em busca de alternativas de manejo das lavouras para diminuir riscos às abelhas, o que abrange desde o manejo integrado de pragas até a seleção mais apurada dos produtos a serem aplicados. “Em caso de problema, a abelha é o elo mais fraco.”
Além de produzir grãos e mel em áreas próprias, Cavalheiro também começou a levar suas colmeias para propriedades de terceiros e foi aí que veio a fase de mostrar aos outros os benefícios da parceria. “Eu expliquei que o manejo com as abelhas poderia aumentar a produção de grãos. Um dos proprietários duvidou, porque sabia que a soja se polinizava sozinha. Mas aí, mesmo sem um trabalho científico (na época), o resultado pôde ser visualizado na prática”, contou.
Tanto Cavalheiro quanto Machado participaram de um estudo da Embrapa Soja (no Paraná) feito em 2016, que constatou as vantagens e como fazer a integração entre apicultura e agricultura. A pesquisa do agrônomo e mestre em Entomologia Decio Guazzoni resultou no livro Soja e Abelhas, publicado em 2017 – confira AQUI a amostra em PDF da publicação. Conforme o sojicultor e apicultor sul-mato-grossense, a expectativa é de que o estudo seja repetido no Estado, possivelmente na próxima safra.
FECHAMENTO
No momento das perguntas dos internautas, especialistas aproveitaram para reforçar a importância da participação dos produtores rurais e aplicadores nas ações de boas práticas. Agregando produtos menos agressivos os polinizadores seu arsenal contra pragas e, dentro do possível, incluindo produtos biológicos. Aldo Machado lembrou que, em 13 anos produzindo mel junto a culturas de soja, nunca teve um caso de perda de colmeia por acidente em aplicações, mesmo sem uso de biológicos. “`Quando isso às vezes acontece, é sempre por falta de comunicação ou de cuidado. Mas a gente ainda vai chegar em todo mundo”, destacou. Segundo ele, a expectativa é de que se triplique a presença de abelhas em áreas de soja este ano no Estado.
Já Luiz Renato Cavalheiro lembrou que no Mato Grosso do Sul ainda não se tem um trabalho significativo com as lavouras de grãos, por receio dos apicultores. “Temos apiários, mas não especificamente para mel de soja. Mas já está ocorrendo um trabalho de conscientização.” Isso dosando de um lado a proteção às abelhas e, de outro, as vantagens da polinização na soja. Tanto que o próprio mediador ressaltou que a equipe coordenadora do Agro Cooperação na Iagro deve ter nesta quinta uma reunião com a Câmara Setorial Consultiva da Apicultura do MS (CSEAP). “Justamente para colher opiniões sobre as ações que podem ser tomadas logo em seguida”, concluiu Espanholeto.
Créditos: Castor Becker Júnior – Assessor de imprensa – SINDAG